Muitas regiões e países procuram desenvolver a economia azul e alcançar os respetivos benefícios – económicos, ambientais e sociais. aplicar a lente das pessoas é uma atitude inteligente e inclusiva.
Muitas regiões e países procuram desenvolver a economia azul e alcançar os respetivos benefícios. Para o efeito tem sido aplicada – tradicionalmente – uma metodologia sustentada na economia clássica. Existe, porém, uma metodologia complementar, focada nas pessoas e no desenvolvimento sustentável.
Desenvolver a economia azul – metodologia tradicional – a lente Economia
Segundo a metodologia tradicional, classificam-se os setores económicos relacionados e as atividades envolvidas na economia azul; estabelecem-se prioridades; e elaboram-se estratégias e planos de ação. A lente utilizada é essencialmente económica, orientada a organizações públicas e privadas, focando-se nos temas inovação, captação de investimento, crescimento empresarial e geração de riqueza.
Em simultâneo, várias instituições e organizações trabalham em paralelo, apoiadas por regulamentação, para proteger o ambiente e salvaguardar os recursos, a biodiversidade e a saúde do planeta.
Adicionalmente, confia-se que as pessoas serão beneficiadas pelo desenvolvimento alcançado, através da criação de emprego e da redistribuição pelo Estado social, de parte da riqueza gerada.
O que ganho com isso?
Porém, as estratégias apenas podem ser bem-sucedidas, se as pessoas sentirem que fazem parte das mesmas e que ganham algo – direta ou indiretamente – com a concretização dos respetivos planos de ação. Cada medida, projeto ou processo tem pessoas dentro. Se as pessoas forem comandadas, podem entregar uma parte do seu talento. Se forem lideradas, não existem limites para a sua contribuição.
A árdua e subtil tarefa de inspirar e mobilizar as pessoas, para que se apropriem das estratégias e atuem de forma colaborativa e empenhada, na concretização dos respetivos planos de ação, cabe aos desenvolvedores de políticas públicas e a todas as lideranças institucionais e organizacionais.
Desenvolver a economia azul – metodologia social – a lente Pessoas
Segundo a metodologia social, classificam-se igualmente os setores económicos relacionados e as atividades envolvidas na economia azul; estabelecem-se prioridades; e elaboram-se estratégias e planos de ação.
Porém, a lente utilizada é essencialmente social, focando-se em responder à questão colocada pelas pessoas:
Economia azul, o que ganho com isso?
São muitas as respostas que podem ser dadas, sublinhando os benefícios partilhados por todos, resultantes do desenvolvimento sustentável da economia azul.
Porém, existe uma resposta concreta e específica, de elevado potencial mobilizador, relacionada com as vocações, o talento e as carreiras profissionais que sustentam a economia azul e que estão diretamente relacionadas com as pessoas.
O foco é agora prosperidade, crescimento pessoal e perspetivas positivas para o futuro de cada pessoa. O primeiro passo consiste em informar, inspirar e captar talento.
Construir o mapa
Para inspirar e captar talento para a economia azul – apoiando o seu desenvolvimento – é fundamental mapear as carreiras profissionais, atuais e futuras, nos setores económicos e atividades envolvidas. A visibilidade 360º das carreiras profissionais disponíveis na economia azul e as respetivas perspetivas de progressão, amplificam a confiança e geram mobilização e ação.
Um mapa faz com que as pessoas se sintam menos perdidas e torna o futuro menos imprevisível e até mais seguro – responde às necessidades fundamentais das pessoas e coloca-as ao leme do seu próprio destino. Promove ainda a iniciativa, a inovação e o empreendedorismo, fundamentais para o desenvolvimento da economia azul.
Em conclusão, o mapa das carreiras profissionais liberta o talento das pessoas e coloca as lideranças das instituições e organizações no seu devido lugar – ao lado das pessoas – apoiando. Não à frente – a puxar; nem atrás – a empurrar.
UM EXEMPLO – ENERGIA EÓLICA OFFSHORE
O setor económico da energia eólica offshore (energia renovável produzida por aerogeradores instalados no mar) é um pilar da economia azul.
O crescimento deste setor e das atividades relacionadas é uma constante global, em aceleração generalizada. Portugal está a dar os primeiros passos e estabeleceu o objetivo de instalar a capacidade de 10 GW até 2030. O Reino Unido instalou a primeira exploração comercial de energia eólica offshore em 2003; ultrapassou já a capacidade de 13 GW; e tem como objetivo alcançar 50 GW em 2030.
Como referido, em Portugal estão a ser dados passos iniciais, mas acelerados, para a criação e consolidação de uma enorme cadeia de valor, com amplos benefícios para a economia e, claro, para as pessoas. Porém, para estas, a indústria da energia eólica offshore é praticamente desconhecida.
Para potenciar e sustentar o seu desenvolvimento, é fundamental construir o mapa das carreiras profissionais associadas, atuais e futuras. Além de clarificar o seu valor para as pessoas – o que ganham com isso – este mapa permite também identificar as necessidades de ensino e formação para o desenvolvimento das competências necessárias.
A criação de um mapa de carreiras profissionais de uma determinada indústria exige, em primeiro lugar, a respetiva caracterização e a identificação da cadeia de fornecedores associados.
A - CICLO DE VIDA DE UM PARQUE EÓLICO OFFSHORE
A vida útil de um parque eólico offshore pode ser superior a 30 anos, desde o trabalho inicial de projeto até ao descomissionamento. Este ciclo inclui várias etapas:
Seleção do local;
Planeamento e desenvolvimento;
Construção e instalação;
Operação e manutenção; e
Desativação ou renovação de potenciamento.
B - CADEIA DE FORNECEDORES
O desenvolvimento de um parque eólico offshore exige a contratação de vários serviços e a aquisição de equipamentos especializados. Cada um dos fornecedores envolvidos emprega pessoas que contribuem, com o seu trabalho, para o desenvolvimento da economia azul.
A cadeia de fornecedores da indústria da energia eólica offshore inclui empresas especializadas em várias áreas:
Desenvolvimento e gestão de projetos;
Aerogeradores;
Componentes de suporte e sistemas auxiliares;
Instalação e comissionamento;
Operação, manutenção e serviço;
Descomissionamento; e
Equipamentos e serviços transversais.
Desenvolvimento e gestão de projetos
O desenvolvimento e gestão de projetos de parques eólicos inclui atividades de pesquisa, com a execução de vários levantamentos e estudos; o envolvimento de partes interessadas; a solicitação de permissões; e a aquisição e gestão de projetos; até ao respetivo comissionamento.
Aerogeradores (turbinas eólicas)
O aerogerador inclui o fornecimento do rotor (incluindo pás); da nacela; e da torre.
Componentes de suporte e sistemas auxiliares (balance of plant)
Esta área inclui o fornecimento de fundações, cabos e subestações offshore e onshore. A fundação é a estrutura entre o fundo do mar e a torre do aerogerador; os cabos da matriz conectam os aerogeradores entre si e à subestação offshore; os cabos de exportação conectam as subestações onshore e offshore. A subestação offshore transforma e transfere a energia coletada pelos aerogeradores. A subestação terrestre faz a interface entre o parque eólico e a rede de energia terrestre.
Instalação e comissionamento
As atividades de instalação são baseadas no porto de construção e no local do parque eólico. Vários tipos de embarcações são envolvidas nas operações realizadas. Incluem-se, nesta fase, a instalação de aerogeradores e respetivas fundações; a instalação de cabos; e os serviços de suporte à instalação.
Operação, manutenção e serviço
A operação, manutenção e serviço (OMS) inclui as operações diárias do parque eólico; a manutenção programada dos aerogeradores; as intervenções não programadas em resposta a eventos ou falhas; as reparações no local; a substituição de componentes; e a logística de manutenção e serviços.
Descomissionamento
Os primeiros parques eólicos offshore em Portugal serão construídos nesta década, pelo que as atividades e os empregos na fase de descomissionamento crescerão nas décadas de 2050 e 2060. À medida que os aerogeradores chegam ao fim da sua vida natural, o promotor decidirá se desativa ou renova a potenciação com novos aerogeradores. Se forem realimentados, o ciclo recomeça.
Equipamentos e serviços transversais
O desenvolvimento de um parque eólico offshore exige ainda a contratação de vários serviços adicionais, relacionados com a formação e certificação de profissionais; a aquisição de vestuário específico e equipamentos de segurança; entre outros.
C - CARREIRAS PROFISSIONAIS ASSOCIADAS
O desenvolvimento de um parque eólico offshore envolve a criação de emprego direto – nas instalações portuárias de suporte e em atividades offshore; e indireto – nas empresas fornecedoras de serviços e equipamentos, localizadas em outros locais.
Será necessário contratar pessoas com elevado nível de qualificação e especializados em várias áreas, incluindo cientistas, engenheiros, gestores de projeto, economistas, gestores de operações, consultores, relações-públicas, oficiais tripulantes de navios, entre outros.
Será também necessário contratar profissionais especializados, com grau de ensino não superior, incluindo técnicos de aerogeradores, assistentes, operadores de gruas, eletricistas, técnicos de fibra ótica, pilotos de veículos operados remotamente (ROV), mergulhadores, marinheiros, técnicos de redes de comunicação, técnicos de acesso por cordas e reparação de pás, técnicos de segurança contra incêndios, operadores de limpeza, técnicos de elevadores, entre muitos outros.
Um estudo recente revela que o desenvolvimento e operação de um parque eólico offshore envolve, no mínimo – direta e indiretamente – mais de 100 profissões diferentes.
Desenvolver programas de ensino e de formação especializada para todos estes profissionais constitui uma atividade prioritária, geradora de elevado valor acrescentado e criação de emprego qualificado, oferecendo oportunidades de desenvolvimento de carreiras de nível internacional e que dão resposta à questão colocada pelas pessoas:
Economia azul, o que ganho com isso?
Se a resposta for considerada positiva, as pessoas irão aderir, enchendo as salas dos centros de formação e instituições de ensino, e ocupando os lugares disponíveis na indústria, retendo o valor acrescentado no território nacional e promovendo o desenvolvimento sustentável.
Colocam-se também as seguintes questões:
Que valor oferece esta indústria, às instituições de ensino; aos centros de formação; às áreas portuárias; aos estaleiros navais; aos cientistas, projetistas e consultores nacionais?
Estarão a preparar-se para aproveitar o valor que aí vem?
CONCLUSÕES
Desenvolver a economia azul aplicando a metodologia tradicional – a lente Economia – é coerente e fundamental.
Desenvolver a economia azul aplicando a metodologia social – a lente Pessoas – é uma atitude inteligente, inclusiva e distributiva de valor na origem.
Juntando e aplicando ambas as metodologias, potencia-se o alcance dos resultados preconizados nas estratégias e nos planos de ação – ganha Portugal; ganham os portugueses.
Os temas abordados serão desenvolvidos no Programa de Especialização e Liderança em Economia Azul (PLEA), a realizar nos dias 25, 26 e 27 de janeiro, em Lisboa. Saiba mais seguindo a ligação abaixo.
Texto: Alvaro Sardinha, dezembro 2022